Sinto-me espantado, decepcionado e satisfeito comigo. Sinto-me triste, acabrunhado, entusiasta. Sou tudo isso e não posso chegar a uma soma, a um resultado final. É para mim impossível constatar um valor ou um -não-valor definitivos; não posso julgar a vida ou a mim mesmo. Não estou certo de nada. Não tenho mesmo, para dizer a verdade, nenhuma convicção definitiva a respeito do que quer que seja. Sei apenas que nasci e que existo; experimento o sentimento de ser levado pelas coisas. Existo à base de algo que não conheço. Apesar de toda incerteza, sinto a solidez do que existe e a continuidade do meu ser, tal como sou.
O mundo pelo qual penetramos pelo nascimento é brutal, cruel e, ao mesmo tempo, de uma beleza divina. Achar que a vida tem ou não sentido é uma questão de temperamento. Se o não-sentido prevalecesse de maneira absoluta, o aspecto racional da vida desapareceria gradualmente, com a evolução. Não parece ser isto o que ocorre. Como em toda questão metafísica, as duas alternativas são provavelmente verdadeiras; a vida tem e não tem sentido, ou então possui e não possui significado. Espero ansiosamente que o sentido prevaleça e ganhe a batalha.
Quando Lao-Tse diz: "Todos os seres são claros, só eu sou turvo", exprime o que sinto em minha idade avançada. Lao-Tse é o exemplo do homem de sabedoria superior que viu e fez a experiência do valor e do não-valor, e que no fim da vida deseja voltar ao seu próprio ser , no sentido eterno e incognoscível. O arquétipo do homem idoso que contemplou suficientemente a vida é eternamente verdadeiro; em todos os níveis de inteligência, esse tipo aparece e é idêntico, quer se trate de um velho camponês ou de um grande filósofo como Lao-Tse. Assim a idade avançada é ... uma limitação, um estreitamento. E no entanto acrescentou em mim tantas coisas: as plantas, os animais, as nuvens, o dia e a noite e o eterno no homem. Quanto mais se acentuou a incerteza em relação a mim mesmo, mais aumentou meu sentimento de parentesco com as coisas. Sim, é como se essa estranheza que há tanto tempo me separava do mundo tivesse agora se interiorizado, revelando-me um dimensão desconhecida e inesperada de mim mesmo.
Carl Gustav Jung
Memórias, Sonhos, Reflexões
Nova Fronteira - 2006
O mundo pelo qual penetramos pelo nascimento é brutal, cruel e, ao mesmo tempo, de uma beleza divina. Achar que a vida tem ou não sentido é uma questão de temperamento. Se o não-sentido prevalecesse de maneira absoluta, o aspecto racional da vida desapareceria gradualmente, com a evolução. Não parece ser isto o que ocorre. Como em toda questão metafísica, as duas alternativas são provavelmente verdadeiras; a vida tem e não tem sentido, ou então possui e não possui significado. Espero ansiosamente que o sentido prevaleça e ganhe a batalha.
Quando Lao-Tse diz: "Todos os seres são claros, só eu sou turvo", exprime o que sinto em minha idade avançada. Lao-Tse é o exemplo do homem de sabedoria superior que viu e fez a experiência do valor e do não-valor, e que no fim da vida deseja voltar ao seu próprio ser , no sentido eterno e incognoscível. O arquétipo do homem idoso que contemplou suficientemente a vida é eternamente verdadeiro; em todos os níveis de inteligência, esse tipo aparece e é idêntico, quer se trate de um velho camponês ou de um grande filósofo como Lao-Tse. Assim a idade avançada é ... uma limitação, um estreitamento. E no entanto acrescentou em mim tantas coisas: as plantas, os animais, as nuvens, o dia e a noite e o eterno no homem. Quanto mais se acentuou a incerteza em relação a mim mesmo, mais aumentou meu sentimento de parentesco com as coisas. Sim, é como se essa estranheza que há tanto tempo me separava do mundo tivesse agora se interiorizado, revelando-me um dimensão desconhecida e inesperada de mim mesmo.
Carl Gustav Jung
Memórias, Sonhos, Reflexões
Nova Fronteira - 2006
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